Tolerância é uma virtude?
Segundo André Comte-Sponville no seu livro Pequeno Tratado das Grandes Virtudes, a tolerância é uma PEQUENA VIRTUDE.
Ele principia o exame dessa questão com duas perguntas:
"Ser tolerante é tolerar tudo?"
"Julgar que há o que seja intolerável é sempre dar prova de intolerância?"
Ele mesmo dá a resposta: Não! É uma questão de limites.
Mas o que é tolerância, afinal?
Segundo o Dicionário de sinônimos (https://www.sinonimos.com.br ›):
"Condescendência e transigência: 1 condescendência, transigência, indulgência, complacência, contemporização, temporização, paciência, compreensão, calma, flexibilidade. Licença ou isenção de algo: 2 licença, isenção, dispensa, liberalização, permissão, consentimento, liberdade."
Já Ethel Peternelli coloca:
“A melhor prova de tolerância é o respeito às diferenças."
"Tolerância é um termo que vem do latim tolerare que significa “suportar” ou “aceitar”. A tolerância é o ato de agir com condescendência e aceitação perante algo que não se quer ou que não se pode impedir."
De novo, acompanhando Comte-Sponville nas reflexões:
"Quando a verdade é conhecida com certeza a tolerância não deve prosperar. Não toleraríamos que o contador que se engana em seus cálculos se recusasse a corrigi-los. Nem o físico quando a experiência diz que está errado. Perseverar no erro, sabendo disso, já não é um erro mas uma falta".
Para isso, o que primeiro deve contar é a inteligência e o amor à verdade. Mas esta, devemos reconhecer, nunca a conhecemos absolutamente nem com toda a certeza. Somos falíveis, imperfeitos. E aí aparece o foco central da questão, segundo ainda Comte-Sponville:
"O problema da tolerância só surge nas questões de opinião."
"A Bíblia não é nem demonstrável nem refutável; portanto, ou se crê nela ou se tolera que se creia nela. Mas se toleramos a Bíblia, por que não 'Mein Kampf'. E por que não o racismo, a tortura, os campos de concentração? "
"Tolerar o sofrimento dos outros , tolerar a injustiça, tolerar o horror não é mais tolerância: é egoísmo, é indiferença ou pior, tolerar Hitler, era ser seu cúmplice, por omissão ou até colaboração."
"Não se pode tolerar tudo, portanto. Porém, não se deve renunciar a toda e qualquer tolerância para aqueles que não a respeitam. Uma democracia que proibisse os partidos não democráticos seria pouco democrática, assim como uma democracia que os deixasse fazer tudo e qualquer coisa seria democrática demais, e por isso condenada, já que renunciaria a defender o direito pela força quando necessário, e a liberdade pela coerção. O critério aqui não é moral mas político."
" Uma ação intolerante, um grupo intolerante, etc., devem ser proibidos se e somente se ameaçarem efetivamente a liberdade ou, em geral, as condições de possibilidade da tolerância. Se as instituições estão fragilizadas, se a guerra civil está iminente ou já começou, se grupos facciosos ameaçam tomar o poder, pode se tornar necessário impedi-los, até pela força."
Karl Popper acrescenta: "Não é necessário impedir a expressão de teorias intolerantes; enquanto for possível enfrentá-las com argumentos lógicos e contê-las seria um erro proibi-las. Mas é correto assegurar o direito de proibi-las caso não haja espaço à discussão lógica e só haja resposta com violência".
"Democracia não é fraqueza. Tolerância não é passividade".
Portanto, se tivermos uma postura filosófica de abertura real para avançar no caminho da maior verdade possível, respeito e TOLERÂNCIA aos contrários, seguramente haveria mais harmonia e paz social.
Não esqueçamos que a intolerância religiosa, racial, ideológica já ceifou e ainda ceifa milhões de mortos na história da humanidade.
E trazendo o exame do tema aos aspectos psicológicos, lembro algumas reflexões feitas pelo psiquiatra e psicoterapeuta Flávio Gikovate, falecido há alguns anos:
- é muito difícil aceitarmos genuinamente opiniões claramente contrárias sem que fiquemos aborrecidos intimamente ou nos sintamos superiores, no plano intelectual ou moral, nem tampouco tenhamos o ímpeto de debochar, ironizar ou desqualificar o outro, ainda que de forma velada;
- a tolerância verdadeira acontece quando as pessoas têm "cérebro poroso" e capacidade de aceitar o contraditório de forma isenta e não pessoal.
Expandir a consciência é o maior desafio, portanto.
Concluindo, a tolerância seria uma pequena virtude porque o ideal mesmo seria termos amor e respeito, mas ...somos humanos...
Bom e oportuno o seu texto, a sua reflexão sobre a tolerância, caríssimo Arnaldo. E notar que retornou com as postagens é também muito legal. Forte abraço, amigo!
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