terça-feira, 10 de março de 2015

A alma imoral – Melhor a traição do que a fidelidade hipócrita ?


Em vários momentos da vida temos a oportunidade de ser coerentes com a nossa alma e trair o corpo. Ou de trair a nossa alma e observar a tradição.
No livro “A Alma Imoral”, de Nilton Bonder, esse conflito é ressignificado a partir de conceitos não convencionais de Corpo e de Alma.
O Corpo responde pela tradição e a Alma pela transgressão : “...quantos casamentos são uma traição profunda à promessa de uma via de enriquecimento afetivo mútuo? Viver esse tipo de casamento, decerto após terem se esgotado todas as medidas possíveis para curar a relação, é uma forma de traição à alma bem mais séria do que um possível adultério representa, traição ao corpo”.
A traição, segundo Nilton Bonder, está a serviço da evolução da espécie, não só na questão dos relacionamentos afetivos mas em toda a gama de comportamentos sociais. Como as mutações no caso da biologia genética.  No caso das relações amorosas, não quer dizer que o adultério seja a solução, já que este pode ter desdobramentos  não desprezíveis tanto para o traidor quanto para o traído,  mas é mais perniciosa a hipocrisia que se dissimula numa conduta dita exemplar.
Um outro conceito pode nos ajudar também a refletir sobre essa temática: a lealdade. Que pode ou não envolver a fidelidade, que tem mais a ver com obrigações, com o cumprimento de regras. A fidelidade pode  até ser “canina”, que faz alguém estar grudado ao outro por conveniência ou submissão, ainda que o outro seja um neurótico, mentiroso, abusador. Lealdade é uma condição moral mais nobre talvez, baseado em valores e envolvendo uma conexão profunda pois implica cuidado, atenção, compromisso com a verdade própria e a do outro.  Ou com uma causa. Mas não implica necessariamente em manter fidelidade ao outro.
A pergunta se impõe:  podemos ser leais numa relação amorosa mesmo que sejamos considerados infiéis ? Como ? Seguindo a nossa “alma imoral” , aquela que pode às vezes optar pela transgressão e abandonar a tradição, sem hipocrisia. E a lealdade se completará ao nos mostrarmos transparentes e honestos com a outra pessoa. Ao parceiro ou parceira caberá, conhecendo e sopesando os fatos, seguir o rumo que julgar conveniente, o da aceitação ou do rompimento. Ou ainda repactuando os termos da relação, aliás algo desejável continuamente. Com possíveis dores, mágoas e todos os riscos imagináveis, mas dentro da verdade. Sabemos que contratos velados ou explícitos, nessa linha de relacionamentos com as verdades postas a nu, não são incomuns nos dias de hoje.
Mas... calma aí, não está se advogando a traição como norma de comportamento ou princípio a ser seguido ordinariamente, especialmente a traição sexual. Ela se situaria, por esse raciocínio, no "ponto fora da curva", uma excepcionalidade, e a meu ver não resultaria de uma mera atração sexual a cada esquina.
Toda essa temática é passada a limpo na obra do Nilton Bonder. E magistralmente apresentada na peça de teatro baseada no livro, com Clarice Niskier, em cartaz há cerca de 7 anos em várias partes do País, sempre com casa cheia. Pra quem vive em São Paulo, onde atualmente se apresenta, é imperdível. Pra quem vive fora,  justifica a visita à cidade.
E onde ficamos nisso tudo em nossa vidinha real ? Dos dois lados, claro, o da tradição e o da traição, afinal, somos humanos e imperfeitos. Sagrados e profanos, a caminho –  idealmente – do crescimento pessoal e coletivo.
Essa perspectiva de traição ou tradição vai depender obviamente de cada um e de cada circunstância, na qual o nossa mente, os nossos instintos e emoções tomarão decisões  às vezes surpreendentes, contraditórias, humanas.
Em outras palavras, o eterno exercício de nosso livre arbítrio. Seguir a tradição ou eventualmente romper com ela!

3 comentários:

  1. Muito bom, amigo. Sobre o assunto, gosto muito do que escreveu Marilyn Ferguson: "O relacionamento transformador define a si mesmo; não procura conformar-se ao que a sociedade considera correto, mas serve somente às necessidades dos participantes. Pode haver princípios orientadores até mesmo acordos flexíveis, mas não regras.
    Nossa saúde e sanidade exigem que aprendamos a levar vidas que sejam genuinamente criativas.

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  2. Parabéns, Arnaldo, por trazer reflexão sobre tema tão complexo e desafiador!
    Abs

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